Os bens dos sete réus – incluindo uma empresa – envolvidos na Operação Tripla Camada, deflagrada pelo GAECO durante a pandemia de covid-19, foram indisponibilizados pela Justiça em recurso proposto pela 9ª Promotoria de Justiça de Itajaí. A decisão interlocutória (ato processual que não analisa o mérito da ação) do Tribunal de Justiça visa garantir um possível ressarcimento aos cofres públicos. Foi pedido o bloqueio de bens até o valor total do dano, que corrigido passa de R$ 12 milhões.
No agravo de instrumento, o Promotor Milani Maurilio Bento, com atuação na área da moralidade administrativa, descreve o prejuízo aos cofres públicos, causado pelo suposto direcionamento e superfaturamento na compra das máscaras descartáveis, para atender à Secretaria Municipal de Saúde de Itajaí.
“A investigação demonstrou que a dispensa indevida da licitação resultou na aquisição de 10 milhões de máscaras ao preço unitário de R$ 1,10, totalizando pagamento de R$ 11 milhões. Na mesma data da primeira entrega, em 1º de abril de 2021, a autarquia pública SEMASA pagou R$ 0,27 por máscara”, descreve na ação inicial o Promotor de Justiça.
Na decisão o Desembargador anotou que “há indícios muito fortes de que os réus dispensaram indevidamente uma licitação, porque não havia urgência que a motivasse, visto que a municipalidade tinha em estoque dois milhões e setecentas unidades de máscaras: o suficiente para o fornecimento de ao menos mais três meses do item que supostamente haveria de ser adquirido com urgência ” e ainda acrescentou ainda que: “o contrato firmado em virtude da dispensa de licitação, embora sob título de urgência, buscava atender demanda estimada para um ano inteiro”.
A decisão ainda trata do superfaturamento e concordou com o Ministério Público que há indicativos suficientes de sua existência para autorizar a indisponibilidade dos bens, e acrescentou que “.. os réus que supostamente estariam em posse dos valores teriam fácil acesso de transferências (e ocultação) de patrimônio e ativos financeiros. Pela própria natureza da ação, do tempo que provavelmente decorrerá e do valor discutido, existe boa chance de que o processo não tenha resultado útil se o valor não for resguardado o mais cedo possível”, esclarece o Desembargador Relator da decisão.
A indisponibilidade dos bens agora vai a julgamento da 5ª Câmara de Direito Público, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, enquanto em Itajaí seguem as três ações propostas pelo Ministério Público contra servidores públicos municipais e um empresário por dispensa indevida no processo licitatório e superfaturamento na compra de máscaras de proteção, sendo uma ação criminal, uma ação de improbidade administrativa e uma ação de reparação de danos.
Relembre o caso
Operação Tripla Camada
A Operação Tripla Camada foi deflagrada em 2022 para apurar possíveis crimes contra a administração pública, mais precisamente fraude a licitação para a compra de máscaras durante a pandemia de covid-19 em 2021.
Pela investigação do MPSC, na segunda quinzena de março de 2021, período da compra, havia estoque suficiente de máscaras para atender à demanda do Município. Em fevereiro do mesmo ano, eram quase 2,8 milhões de unidades do produto estocadas. O montante seria suficiente para uso entre profissionais da área da saúde e a população por pelo menos sete meses. O setor de saúde do Município utilizava 300 mil máscaras por mês.
Na compra com dispensa de licitação em março de 2021, foi incluído pedido de máscaras também à Secretaria Municipal de Educação. Contudo, foi constatado que em abril não houve aula e as máscaras foram adquiridas para uso até o fim de dezembro de 2021. Havia tempo de sobra para fazer licitação e produto em estoque, conforme constatado pela investigação.
Mesmo com a quantidade estocada, a aquisição de 10 milhões de máscaras teria sido autorizada. Isso demonstra que a alegação dos envolvidos de que a compra de urgência e a consequente dispensa de licitação eram necessárias não se justifica, tendo o Município um volume grande de unidades naquele período.
“Portanto, os denunciados, em conluio, possibilitaram e autorizaram a contratação direta da empresa para fornecimento de 10 milhões de máscaras cirúrgicas ao Município de Itajaí, e assim dispensaram licitação em desacordo com as hipóteses previstas em lei, em prejuízo ao Município de Itajaí no valor mínimo de R$ 8,3 milhões”, sustenta o Promotor de Justiça.
Saiba mais
De acordo com as ações judiciais, a solicitação indevida de dispensa de licitação para a aquisição da quantia de dez milhões de máscaras descartáveis teria partido do Secretário Municipal de Saúde, do Diretor Administrativo e da Gerente de Compras com o auxílio da Diretoria Executiva da Secretaria Municipal de Saúde.
Por sua vez, de acordo com a apuração, o empresário participou diretamente do processo no ajuste para fraudar a licitação para que sua empresa pudesse firmar o contrato da compra com o Município. O procedimento de dispensa, porém, não preenchia as hipóteses estabelecidas em lei.
Na época da aquisição, não estava vigente autorização legislativa de dispensa genérica diante da pandemia causada pela covid-19, razão, inclusive, pela qual os documentos da dispensa para aquisição das máscaras em seus fundamentos legais não fazem referência a qualquer norma. A dispensa foi fundamentada somente na Lei de Licitação, com a alegação da situação de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus.
“Entretanto, embora inegável a situação pandêmica vivida à época, pelo que ficou constatado, não havia qualquer urgência na aquisição de dez milhões de unidades de máscaras descartáveis que justificasse a compra sem licitação”, argumenta o Promotor de Justiça na ação de improbidade.